quinta-feira, fevereiro 18, 2016

“Descobri no ultrassom a microcefalia do meu bebê”

Perto de completar sete meses de gestação, a carioca Mariana Mendonça soube que seu tão desejado segundo filho nasceria com a má-formação, condição associada ao vírus zika
ALINE RIBEIRO

Mariana Mendonça,grávida de Leandro,diagnosticado com microcefalia.Ela teve zika no segundo mês de gestação (Foto: Andre Arruda/ÉPOCA)
Mariana Mendonça, grávida do tão esperado segundo filho. O bebê foi diagnosticado com microcefalia depois de Mariana apresentar os sintomas de zika (Foto: Andre Arruda/ÉPOCA)

Ao longo de dois meses do ano passado, a terapeuta capilar Mariana Mendonça, de 33 anos, compareceu dia sim dia não a um laboratório em Bangu, no Rio de Janeiro, para exames de controle de ovulação. Sempre que a ultrassonografia apontava o período fértil, o médico recomendava: “Você precisa namorar amanhã”. Mariana cansou de namorar mecanicamente. “Não pegava de jeito nenhum”, diz ela, sobre a dificuldade de engravidar.
Depois de decidir interromper o acompanhamento médico, a menstruação atrasou. Numa manhã de junho, Mariana aproveitou uma consulta de rotina em seu ginecologista e comentou do atraso. Fez um exame de sangue e confirmou que estava grávida de um mês de seu segundo filho. “Entrei no carro, liguei o ar condicionado e fiquei ali parada um tempão”, diz. Contou para o marido, o comerciante Anderson Pereira, pelo Whatsapp: “Você vai ser papai de novo. Vamos ter mais um anjinho”. Foi uma festa ao se encontrarem em casa.

Mariana já tinha Cauã e não pensava em engravidar de novo até sua mãe ter um infarto fulminante e morrer, em 2012. Se ao lado de duas irmãs já era difícil superar o luto, para uma criança sozinha, no caso de ela própria vir a faltar, seria insuportável. A partir da descoberta dolorosa, Mariana não só planejou como também desejou muito sua segunda gravidez. Aos dois meses de gestação, a barriga nem bem aparecendo ainda, Mariana teve seu corpo tomado por manchas vermelhas, dores fortes e uma febre não muita alta. Tirou uma foto das marcas mais evidentes e mandou para o médico. Era o mês de agosto, e o zika ainda não havia tomado o noticiário. Tanto o filho Cauã quanto o marido Anderson apresentaram os mesmos sintomas. Seu obstetra pensou se tratar de dengue. Mariana ficou de repouso por uma semana e se tranquilizou. Não podia imaginar que aqueles seriam os últimos dias de tranquilidade até o final de sua gravidez.

Pela televisão, Mariana soube duas semanas depois da existência de um novo vírus que circulava pelo país aterrorizando as mulheres grávidas, a zika. “Eu pirei”, afirma. As ultrassonografias seguintes não indicaram nenhuma anormalidade, mas Mariana não se acalmava diante das incertezas dela e dos médicos. “E se passar pela placenta? O que pode causar lá dentro?” Ninguém sabia – e ainda não sabe – explicar. Ao completar sete meses de gestação, sem contar para seu obstetra, Mariana recorreu a um amigo médico em janeiro: “doutor, eu não quero esperar a próxima ultra. Tive zika, preciso tirar essa dúvida da minha cabeça agora”. Marcaram o exame para a noite daquela mesma semana. Mariana foi a última a ser atendida. Estava acompanhada do marido Anderson e de Cauã, o filho de 5 anos.

Exames de ultrassonografia naturalmente despertam uma grande ansiedade nos pais. Diante da possibilidade de um diagnóstico como aquele, Mariana se sentia perto de explodir. Deitada na maca, com os olhos fixados no monitor que mostrava seu bebê em imagens distorcidas, Mariana ouviu do médico amigo que seu filho tinha mesmo um atraso na formação da cabeça: seu peso e perímetro equivaliam ao crânio de um feto três semanas e meia mais novo. Ao confirmar o que tanto temia, Mariana chorou sem controle. O marido, apesar de tentar “segurar a onda sempre”, daquela vez não se conteve. O filho Cauã observou tudo sem compreender. O médico, um homenzarrão de quase dois metros de altura, abraçou a amiga e tentou descontrair: “não faz isso comigo senão eu choro também”.

“O mundo da gente se abre”, diz Mariana, ao relembrar daqueles poucos minutos que transformaram suas últimas cinco semanas num misto confuso de ansiedade e auto-comiseração. Assim que recebeu o diagnóstico de microcefalia associada a hidrocefalia de seu bebê, Mariana foi para a internet e leu tudo, inclusive o que não devia, sobre essas condições. Entrou num grupo de mães no Facebook que se encontram em situação semelhante à dela. Tenta insistentemente prever como será o futuro com o filho, Leandro. Numa de suas buscas, cruzou com Pollyana (leia a história de Pollyana aqui), um pouco mais experiente, àquela altura já com Luiz Phillipe por perto. Encheu sua caixa de perguntas no dia 25 de janeiro. “Seu caso foi por zika? Você teve sintomas na gestação? Desculpa perguntar, mas como tudo é muito novo para mim, fico buscando informação. Ele precisou ficar na UTI? Nasceu de 39 semanas? Mama no peito?”.

Serenamente, Pollyana explicou o que Mariana já sabia – mas que não consegue continuar ignorando: cada caso é um caso e, por isso, de nada adianta especular. “Nossos filhos são crianças de luz. Q Deus mandou pra nos fazer enxergar a vida de outro ângulo”, escreveu Pollyana. Com a ajuda de sua terapeuta e de florais, Mariana tenta controlar a ansiedade nesta reta final da gravidez. Parou de ler sobre o assunto. Saiu do grupo de mães. Para não pensar em bobagem, trabalha muito e se ocupa com os últimos detalhes antes da chegada de Leandro, como as lembrancinhas de urso para a maternidade e a montagem do berço. Aos sete meses e meio de gestação, vivia um dilema na semana passada. Ao mesmo tempo em que sabe que o melhor para o filho seria completar o nono mês para não nascer prematuro, é tomada por uma sensação incontrolável de querer vê-lo aqui fora. Quer compreender como a microcefalia afetou sua cabecinha. Ter alguma noção, ainda que remota, de que futuro a espera.

Postar um comentário

Blog do Paixão

Whatsapp Button works on Mobile Device only

Start typing and press Enter to search